Graças ao Centro Galego de Artes da Imagem, pudemos desfrutar ontem dum passe gratuito de Dhogs, grande vencedora dos prémios Mestre Mateus com 13 galardões.
Acudimos com grandes reservas. Desde a sua estreia em Sitges 2017, tem recompilado críticas bastante boas; algumas mesmo a ligar este filme a realizadores como Lynch ou Haneke, ou a outros títulos como Holy Motors. Felizmente, a diferença com o francês Leos Carax, a ideia dum bom filme para Andrés Goteira não parece implicar uma dura batalha contra a sonolência.
E não deixa de ser um filme galego; assim que ficamos com uma grata surpresa ao comprovar que não se trata dum tele-filme, dum produto underground ou, especialmente, dum exercício de pedantice próprio da nova onda local. Não estamos a brincar com estereótipos: a diversidade cinematográfica depende da indústria, e nesta colónia mal sabemos o que significa essa palavra desde que o governo de Felipe González destruísse o naval e a metalurgia.
Dhogs é uma história complexa, sim; mas, não obstante, consegue reter a plateia até o final em base a grandes doses de suspense e ao mesmo mistério que envolve toda a sua estrutura. Proposta inclassificável, a narração apresenta diversas histórias como peças individuais dum puzzle a compor no seu desfecho uma imagem global e bivalente sobre a natureza humana. Uma bivalência presente no próprio título, palavra-valise a amalgamar a fidelidade (dog) com a imundice (hog).
Assim temos um misterioso taxista (Antonio Durán “Morris”), um executivo (Carlos Blanco) a curtir com uma jovem descontraída (Melania Cruz), a mesma jovem a ser assaltada por um mitra (Iván Marcos), uma mãe (María Costas) preocupada com o futuro do seu filho, empregado numa gasolineira dum deserto, um solitário caçador (Miguel de Lira) em companhia do seu cão doente… Qual é a ligação entre isto tudo? É melhor assistir.
Dhogs é a obra prima do seu realizador, quem conta com um elenco longamente conhecido no audiovisual galego. O filme, aliás racha em diversas ocasiões com a “quarta parede”, o que provoca um certo distanciamento emocional com a crueza da história; e constitui mais outro elemento para a reflexão final sobre a violência, aqui tratada com certa contenção. Pouco ou nada a censurar no aspecto técnico. Talvez a trama é por momentos obscura, e o episódio introdutório não ajuda precisamente a albergar grandes esperanças sobre o seu desenvolvimento. Porém alivia comprovar que estamos face uma proposta original e arriscada, pouco frequente nestas latitudes.
- A favor: É uma proposta interessante que toca vários géneros e que consegue gerar suspense.
- Em contra: A cena introdutória e totalmente prescindível com os dois guardas de segurança.