Não é ruim apenas a fornada

Boa recriação duma viagem com LSD, as coisas como elas são.

Depois da original peça de vampirismo que supôs A Girl Walks Home Alone at Night (2014) era lógico ter umas elevadas expectativas a respeito do segundo filme duma das grandes esperanças femininas do género: Ana Lily Amirpour. Porém, esse Mad Max para hipsters que é The Bad Batch falha em praticamente tudo, e mal se advertem as virtudes que fizeram especial o filme de debute da anterior.
A lástima é que tem um poderoso arranque de sinistra distopia. Por algum delito que nunca acabamos de conhecer; Arlen (Suki Waterhouse) é abandonada num deserto que é à vez um limbo legal e moral. Não demora em ser sequestrada por uma espécie de clã de canibais halterofilistas aficionados à música ligeira, quem a devoram um pouquinho. Ainda desculpando a incrível fuga da jovem mal-ferida, damo-nos conta logo que isto não funciona: Arlen é finalmente resgatada e levada a um assentamento chamado Confort e que é como uma espécie de Ibiza após-apocalíptica em temporada baixa. Meses depois, num incidente no deserto; Arlen mata uma mulher canibal e adopta à sua filha órfã, a quem leva para Confort. O problema é que o pai canibal (Jason Momoa) sai na sua procura com a ajuda dum irreconhecível Jim Carrey, quem leva messes sem tomar um duche.

Sim, este é Jim Carrey.

Tudo resulta extraordinariamente banal e gratuito nesta improvável mistura entre Cherry 2000 e Spring Breakers, confusão salpicada dum simbolismo inútil e sustentada numa presunção sem limites. O principal problema é que The Bad Batch está pessimamente escrito. Quando achas que o filme vai derivar cara uma espécie de western futurista com capacidade talvez de redimir-se; derrapa cara a uma impossível e absurda história romântica que deixa morais bastante questionáveis: os canibais também são pessoas, e as gajas infelizmente sempre se apaixonam de malandros. O que é uma boa mostra de que não é preciso ser um homem para fazer um produto que fede a patriarcado.

É um assassino canibal e intentou devorar-te. Mas também é um pai dedicado que põe sempre um prato na mesa.

Ademais de Jim Carrey, Amirpour recupera desnecessariamente também Giovanni Ribisi e um catastrófico Keanu Reeves; quem rivaliza com a própria Suki Waterhouse na interpretação mais hilariante. Em favor de ambos é preciso dizer que pouco podiam fazer com um guião cheio de diálogos ridículos, metafísica das barracas e nula preocupação pela construção duns personagens verosimilhantes que conduzam a história por veredas causalmente lógicas. É por isso que, entre outras coisas, nunca chegamos a entender a passividade da menina ou as desavenças entre Arlen e o status quo de Confort. Uma grande bosta.

É uma rave constante, dão drogas de graça e não comem humanos: o único problema de Confort é que está governado por Keanu Reeves.

Para não deixar isto num simples exercício de crueldade, destacarão-se duas virtudes em The Bad Batch. Uma tem a ver com a estética do filme, o cuidado da imagem, a fotografia. Amirpour já demonstrou essa habilidade na bela A Girl Walks Home Alone at Night. Outro ponto positivo seria uma interessante trilha sonora que invoca fontes tão diversas como Ace of Base, Culture Club ou Die Antwoord.

  • O melhor: a fotografia.
  • O pior: um guião péssimo e presunçoso.

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