Não há nada como um desastre pós-apocalíptico para juntar os pedaços dum coração partido. Essa parece ser a premissa duma irregular The Domestics.
Mark e Nina (Tyler Hoechlin e Kate Bosworth) são um casal que não passa pelo seu melhor momento. O final da civilização surpreende-os em pleno processo de divórcio. Ela quer viajar para Milwakee, à casa familiar, com a intenção de comprovar se os progenitores seguem vivos e também na atitude de «vou para casa dos meus pais», com o que isso comporta numa relação. Ele acompanha-a e protege com certo desgosto, consciente de que a coisa não vai durar muito além de Milwakee. O problema é que os sobreviventes do Armagedom, quando menos nos EUA, são gangues de delinquentes gremiais, que se repartem o país numa constante guerra territorial e numa espécie de competição por ver qual dessas bandas é mais absurda. Há uma gangue de limpa-neves, de ludopatas (que jogam com a sorte das suas vítimas), os sheets (quem se disfarçam com lençóis, como fantasmas), os pregadores (que parecem saídos directamente de Mad Max 2) e, com diferença, o gangue mais interessante de todos: as cherries, um género de guerrilha feminista do que é membro a única personagem secundária que merece um spin-off. Portanto, a volta a casa é bastante problemática quando devem atravessar um mosaico humano de pirados assassinos.
O resumo anterior desenha uma sinopse promissória que não se corresponde com as qualidades reais do filme. Eles vão para Milwakee, mas The Domestics não vai para lado nenhum. Alguns comparam com The Purge, porque é basicamente uma “purga” indefinida; mas carece da profundidade política da saga desenhada por James DeMonaco. Outros acham parentesco com a distopia de Stake Land ou The Road, mas estas são perspectivas trágicas da humanidade; enquanto The Domestics mal consegue estabelecer um equilíbrio entre o drama e a comédia. Nunca chega a envolver emocionalmente o espectador e carece do humor suficiente como para ser inteiramente desfrutado em qualidade de série B. Há homenagens explícitas de A Clockwork Orange e Les yeux sans visage, a querer sugerir uma reflexão sobre a violência que infelizmente fica num plano muito superficial. De facto, sim são pouco subtis as referências a Tarantino; porém, mais uma vez, o humor deste é um ingrediente fundamental que Mike P. Nelson não sabe dosar.
E claro, o futuro pós-apocalíptico, com a sua conseguinte dissolução social, é um recurso bastante útil na ficção para reflexionar sobre muitas coisas: a abusiva relação entre o ser humano e a natureza, a percepção duma crise moral a emergir na sociedade contemporânea, a defesa da integridade pessoal num mundo sem apoios éticos, a saudade por uma solidariedade comunitária mecânica, etc. Dá a sensação de que The Domestics rápido desaproveita essa oportunidade entre diálogos parvos e situações pouco plausíveis. A moral de que o amor salva o mundo, é duma inocência embaraçosa. Não ajuda a constante contextualização via voz em off, as intervenções dum locutor de rádio que explica tudo e a aparição na tela dum mapa que mostra os avanços dos protagonistas.
No plano positivo, poderia destacar-se que a partir de determinada altura, The Domestics abandona um drama bastante frio para deixar de tomar-se a sério. Justo o que a crítica detesta: o entretenimento do público.
- A favor: a personagem de Betsy (Sonoya Mizuno).
- Em contra: chato e pouco plausível.