Millennials contra o sistema

Estamos face uma alegoria dos EUA

Encontrar-se num filme um manifesto contra-cultural que chama a insurreição feminista armada contra o conservadorismo imperante, deve ser indicativo de várias coisas no clima político norte-americano.
Isso é mais ou menos o que oferece Assassination Nation, escrito e dirigido por Sam Levinson. Através da voz narradora de Lilly (Odessa Young) chegamos, não por acaso, a Salem. Sabemos então que estamos face uma caça de bruxas; mas, se tivermos alguma dúvida, Lilly promete que a história tocará todo tipo de temas complexos relativos aos Estados Unidos: violência, machismo, classismo, racismo, homofobia, transfobia… e anuncia já que toda a vila quer assassinar ela e as suas amigas. Como é que se chega a este ponto?

Começa como comédia adolescente. Não desesperem.

Tudo começa com um enredo bobo de liceu e adolescentes do género Clueless, só que no século XXI e com a geração dos milennials. O grupo de amigas composto por Lilly, Em (Abra), Sarah (Suki Waterhouse) e a transgénero Bex (Hari Nef) assistem desde certa distância a um escândalo político gerado por um misterioso hacker que acaba com o suicídio do prefeito e com uma campanha de assédio ao director do liceu. O anónimo atacante informático, entra nos dispositivos electrónicos dos habitantes e vai desvelando pouco a pouco todas as perversões que se ocultam após o verniz quotidiano de boas maneiras e hipocrisia. Isto vai dissolvendo os laços comunitários e os moradores de Salem entram numa dinâmica de todos contra todos. As coisas torcem-se de modo significativo quando os cidadãos tomam a decisão de restabelecer a ordem que a polícia não é quem de preservar. Nesta altura, o filme adquire uma direcção parecida à saga de The Purge.

Mexeram na rapaza errada.

E como afecta isto às protagonistas? Inicialmente vítimas do ataque informático (de modo especial, Lilly) tornam-se suspeitas do mesmo em base a um interrogatório pouco ortodoxo da nova força cidadã. Perseguidas pelas multidões enfurecidas, a turma não tem outra saída do que uma auto-defesa armada que evoca The Purge 2 ou, de maneira explícita, a série de filmes japoneses da banda feminina Nora-neku rokku; uma das inspirações dos dois volumes de Kill Bill. E até chega a converter o We Can’t Stop de Miley Cyrus numa ode feminista.

Agora é que os fascistas vão saber.

Deve-se louvar a frescura e o atrevimento narrativo da metragem, que compensa o facto de não andar com subtilezas. Mas também é preciso assinalar que o filme não é assim tão selvagem como a sua narradora prometia. Seja como for, é uma entretida declaração subversiva e insurreccional contra o mandato de Trump, que aliás resulta interessante pelo infrequente.

  • A favor: estilo interessante para um enredo against the man.
  • Em contra: promete mais do que acaba por oferecer.

 

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