A floresta do tempo perdido

Cuidado com esta gaja.

A Floresta das Almas Perdidas foi estreada no Fantasporto do ano passado, e em Outubro nas salas comerciais daquele país; mas é apenas agora que chega a nós.
Não podíamos conter a curiosidade, uma vez que Portugal não é especialmente prolífico no terror. E isso apesar de os seus dois primeiros filmes de ficção serem baseados no psicopata galaico Diogo Alves, cuja cabeça é conservada na Faculdade de Medicina de Lisboa com intenções prováveis de interesse frenológico. Não será até a década de 1960 que o cinema português se aproxime do género. O Crime de Aldeia Velha (1964) é uma interessante história sobre a intolerância e a repressão sexual, que tem um mérito maior se consideramos o pouco propícia que era a altura no país para a criatividade artística.

Introdução que não era assim muito necessária.

Para além dalguma incursão de António Macedo, de quem falamos brevemente (e falaremos) nalguma outra ocasião, as longa-metragens lusas de terror são contemporâneas e bastante fraquinhas; a começar por Coisa Ruim (2006), filme que faz spoiler no título porque isso é exactamente o que vamos assistir. Outro filme posterior, Eclipse em Portugal (2014), parece optar por uma via próxima ao trabalho do espanhol Álex de la Iglesia, com um humor costumbrista e um bocadinho parvo.

Blablabla

Em metragens mais reduzidas encontramos alguma coisa resgatável: desde o found footage de A Curva (2004), à história de perigos no espaço na linha de Alien, Dédalo (2013); passando pelo gore disparatado de Banana Motherfucker (2011). E convém também aqui destacar a interessante media-metragem Ponto Morto (2014).
E então? Onde deixa esta irregular tradição o filme de José Pedro Lopes? A premissa parece partir duma espécie de Aokigahara luso: há uma floresta onde a gente acode para suicidar-se. Nele encontram-se por acaso dois personagens contrapostos: um idoso de carácter amargo que sente ter falhado à sua família, e uma millennial hipster do género gótico que banaliza todo o relativo à morte. Ambos iniciam uma conversa do tipo existencialista das barracas que dura quase meia hora onde passeiam as suas diferentes motivações para o suicídio, a distância geracional, algumas referências pop e citações de Nietzsche, Van Gogh e, subtilmente, Gaspar Noé. Então sim, estamos face um filme português. No pior sentido do termo.

Não percam o segundo plano, porque a antagonista vai passear por ali bastante.

O único que muda é uma viragem argumental que está longe de ter alguma justificação. Do drama existencial lentamente dialogado, passamos a uma espécie de slasher (também das barracas) onde uma das anteriores personagens erige-se em antagonista matando ao outro e assediando a família do defunto. Por quê? Que mais tem?

uuuuuuh… medo.

Esta banalidade rodada a preto-e-branco intenta seduzir com o seu ar indie-presunçoso e, a julgar pelos prémios coletados, houve quem se deixou conquistar. Destacam talvez as interpretações; de modo específico, Daniela Love, Jorge Mota e Mafalda Banquart. O resto manqueja bastante na sua incapacidade de estabelecer uma reflexão vital substantiva ou um suspense que faça agarrar os braços da poltrona com tensão, ambos principais ingredientes desta refeição que não acaba de coalhar. Deixa-se ver, não dura demasiado e não ficará eternamente na memória.

  • A favor: As interpretações.
  • Em contra: não funciona nem como drama, nem como terror.

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